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O Dia dos Químicos e a arte da transformação

Artigo de Vanderlan Bolzani, Professora Titular da UNESP, Vice-Coordenadora do CIBFar e Conselheira da SBQ e SBPC, para o Jornal da Ciência

Toda matéria encontrada no universo é composta pelos elementos químicos que compõem a tabela periódica dos elementos e esta fantástica compilação de átomos e moléculas é responsável por todas as substâncias encontradas na terra, desde as mais simples e vitais como oxigênio, água e a amônia, até as estruturas moleculares de enorme complexidade, como o DNA. Indiscutivelmente, sendo a Química a ciência da vida na terra, o estudo das propriedades da matéria e suas transformações é de primordial importância para o desenvolvimento humano e ao seu bem estar atual e futuro.

Mais de 3,5 bilhões de anos de evolução químico-biológica podem ser traduzidos pela formação de milhares de substâncias simples e complexas que compõem a vida na terra. Tais substâncias, conhecidas como metabólitos primários e secundários, são fonte inesgotável de inspiração acadêmica e tecnológica para a criação humana. Os metabólitos secundários, ou produtos naturais, se destacam pela incomensurável contribuição que têm dado aos avanços da síntese orgânica moderna e da química medicinal, cujas infinitas aplicações marcaram definitivamente a história do homem no planeta, com destaque para os medicamentos, defensivos agrícolas, fontes renováveis de energia, materiais de higiene, alimentos, cosméticos, entre outros.

O acesso sobre inúmeras informações genéticas, bem como o acelerado desenvolvimento dos estudos “-oma” (Genoma, Transcriptoma, Proteoma e Metaboloma), além do crescente desenvolvimento da engenharia metabólica, tornam a química uma área de pesquisa altamente estratégica, apta a responder inúmeras questões sobre o universo micromolecular da natureza ainda pouco conhecido, no que se refere ao seu funcionamento e interação intra e interespecífica dos organismos que habitam os ambientes terrestres, aquáticos e marinhos.

A história da química está repleta de exemplos fascinantes de produtos que revolucionaram o mundo e assim, nada mais justo termos um dia inteirinho para comemorarmos; o Dia Nacional dos Químicos (18/06). A data deve ser destacada não apenas para celebrar a importância do trabalho desses profissionais, mas, especialmente para mostrar ao público a relevância da Química como base para o desenvolvimento tecnológico sustentável, neste momento da vida da sociedade brasileira. Nas últimas décadas, o país conseguiu aumentar em grande escala o número de profissionais formados em cursos superiores e técnicos de química. Essa conquista, em que pesem as lacunas ainda existentes, foi um componente importante no processo de crescimento que levou o Brasil a se situar entre as dez primeiras economias do mundo. Não há país que consiga responder aos desafios do desenvolvimento sem uma indústria química que exiba eficiência nos setores essenciais do Brasil atual – petróleo, energia, agricultura, pecuária, fármacos, agroquímicos, novos materiais.

Para os mais jovens vale lembrar, entretanto, que essa trajetória foi repleta de obstáculos. Indústria e academia conviveram, ao longo de muitos anos, com sucessivas crises. Com falta de capital e tecnologias de vanguarda para o desenvolvimento empresarial, com recessão, com falta de recursos para as universidades e com momentos de amargo pessimismo. No caso da pesquisa científica, algumas áreas, chegam a ser surpreendente que o país tenha conseguido, em alguns campos, dar saltos tão significativos em quantidade e qualidade da produção. Esta é uma constatação que pode ser confirmada pelo número de pesquisadores de renomados centros internacionais interessados em realizar pesquisas em conjunto com brasileiros.

Avanços que agora parecem “naturais” foram frutos do esforço de pessoas persistentes e comprometidas com a visão de que ciência, tecnologia e inovação não são um custo para a sociedade e sim um componente insubstituível para gerar riquezas no século XXI. Nas crises, uma solução, e não um problema. Visão que, no caso do Brasil, convive com a exasperante lentidão das mudanças, este ano agravadas por uma crise institucional, política e financeira preocupantes. O país levou mais de dez anos para mudar uma lei restritiva à pesquisa de sua biodiversidade, causando um atraso tecnológico substancial de um setor econômico mundialmente rentável, num país que abriga uma das maiores biodiversidade do mundo, detentor de uma riqueza molecular imensurável!

Hoje, os jovens químicos que estão nos bancos das universidades e dos cursos técnicos, ao celebrar o seu dia, como cidadãos exerçam com excelência, responsabilidade, senso e sensibilidade, a profissão de químicos pesquisadores, professores, gestores, tão edificantes e essenciais para mudar o cenário econômico e social de nosso país. Saudações especiais aos jovens químicos.

Vanderlan da S. Bolzani,

Professora Titular do IQ, UNESP

Vice-Coordenadora do Centro de Pesquisa e Inovação em Biodiversidade e Fármacos – CIBFar

Diretora da AUIN-UNESP, Conselheira da SBQ e SBPC